sábado, 11 de setembro de 2010

Fiéis católicos perdem Frei João Domingos


Era do seu serviço religioso que se ouviam aos domingos, quando lhe cabia pregar a palavra, os mais críticos sermões lançados à sociedade angolana.



Não tinha um tema por excelência pois as suas intervenções eram transversais de uma maneira geral e tanto dava tecer críticas ao comportamento individual e social, como às acções do Executivo.



Aqui punha sempre no cerne da sua abordagem o homem que no seu entender deveria prezar valores como a solidariedade e afastar-se da luxúria, inveja, avareza e outros comportamentos tidos como anti-morais, segundo os padrões da sua Igreja.



Por causa da sua frontalidade na apresentação das críticas, Frei João Domingos foi aplaudido de um lado mas também criticado de outro, havendo mesmo sectores que o acusavam de se estar a embrenhar num terreno movediço como é a política.



Não raras vezes as suas homilias serviram de inspiração para a produção de textos jornalísticos de escribas da praça, por carregarem, justamente, aquela mensagem interpelativa aos mais distintos níveis sempre com o objectivo de apontar os males que enfermam a sociedade angolana dos dias de hoje.



Depois de se ter batido pela necessidade de se alcançar a paz para o desenvolvimento do país, a corrupção passou a ser, mais tarde, o seu tema de excelência e aqui não poupou críticas à gestão do Executivo.



A sua morte foi lamentada por vários sectores da sociedade angolana com particular realce para os correligionários da Igreja Católica e colegas que exaltaram as suas qualidades pessoais e de homem de profunda fé cristã.



Ainda em vida, como que movido por alguma premonição, teria manifestado desejo de ser sepultado ali onde ele morresse, dizia para não aportar problemas aos seus irmãos de Igreja, mas o destino quis que ele morresse na sua terra natal.



Segundo informações avançadas por colegas da Igreja Católica, Frei João Domingos vinha sendo acometido há já algum tempo por perturbações de natureza intestinal que o levaram a ser operado em Portugal.



Terá resistido à primeira intervenção cirúrgica, mas quando já em estado de convalescença e tudo a apontar para uma boa recuperação do seu estado de saúde, foi acometido por ataque cárdio-vascular ao qual não resistiu e sucumbiu na passada segunda-feira.



O seu activismo grangeou-lhe a estima e simpatia de largos sectores da sociedade angolana que procuraram expressar pesar pelo seu desaparecimento.



O percurso do padre católico



Nasceu em Portugal, na região da Serra da Estrela, e foi baptizado com o nome de Domingos Fernandes.Após a sua ordenação como padre dominicano, adoptou o nome João Domingos.



Obteve a sua licenciatura e mestrado em Teologia em França e Canadá, respectivamente.Antes de ser indicado para trabalhar em Angola desempenhou vários cargos, com destaque para a docência.



Foi director e professor no seminário dominicano português, professor de filosofia no Centro de Estudos de Fátima e de Teologia na Universidade Católica de Lisboa.



Em Angola, onde chegou em 1982 a convite do então bispo do Sumbe, província do Kuanza-Sul, Dom Zacarias Kamuenho, o frei João Domingos engajou-se em actividades acometidas à confraria dos irmãos dominicanos no país.





A conferência Episcopal de Angola e São Tomé viria a convidá-lo mais tarde para funções de docência em instituições da Igreja católica no país, tendo sido indicado reitor do Instituto de Ciências Religiosas de Angola, a instituição que pela primeira vez, depois da proclamação da Independência nacional abriu um curso para educadores sociais numa altura em que o país se confrontava com situações de crise humanitária e social.



Conjugando a actividade docente com a religiosa, João Domingos também foi Superior dos padres dominicanos em Angola e primeiro pároco da paróquia do Carmo, em Luanda.



Na sequência da sua actividade docente, Frei João Domingos fundou o Instituto Superior João Paulo II e o Centro Cultural Mosaico.



Em Angola, foi ainda reitor e docente de Doutrina Social da Igreja no Seminário Maior e no Instituto de Ciências Religiosas de Angola.



Leccionou Deontologia no curso médio de educadores sociais e doutrina social da Igreja e Direitos Humanos, no Seminário Maior de Luanda, e do curso de Educação Moral e Cívica e de Teologia Pastoral, na mesma instituição.



Em 1998, foi agraciado com a comenda da Ordem Mérito do Estado Português. Frei João Domingos morreu aos 77 anos e dedicou 53 dos quais à Igreja Católica, sendo que 28 deles passados em Angola.







Eugénio Mateus

18 de Agosto de 2010